Caminhoneiro e um funcionário de um terminal do
Porto de Santos foram condenados pelo tráfico internacional de 265 kg de
cocaína
A causa de diminuição de pena relativa ao tráfico
privilegiado (artigo 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343/2006) é inaplicável quando
as circunstâncias do caso concreto revelarem uma ação própria às desenvolvidas
por organizações criminosas. Com essa observação, o juiz Roberto Lemos dos
Santos Filho, da 5ª Vara Federal Criminal de Santos (SP), negou a benesse ao
condenar um caminhoneiro e um funcionário de um terminal portuário pelo tráfico
internacional de 265 quilos de cocaína.
Além de apontar a grande quantidade da droga
apreendida, o modo como ele foi ocultada em um contêiner com carga lícita
(técnica conhecida como rip on/rip off) e a cooptação de caminhoneiros e de
funcionário do centro de controle de terminal portuário, o julgador destacou
que o grupo envolvido nessa logística possuía de antemão informações sensíveis
de segurança para o comércio exterior e operação portuária (porto de destino da
carga, localização do contêiner, posicionamento das câmeras de vigilância etc).
Ainda na fundamentação da sentença que condenou os
réus e lhes negou a hipótese de redução da pena prevista na Lei de Drogas, o
magistrado concluiu que eles não poderiam, sem contar com o auxílio de terceiros,
ingressar com os 265 quilos de cocaína no Brasil e negociar a sua remessa à
Europa. Segundo o sentenciante, as provas são mais do que suficientes para
formação do convencimento de que os acusados integravam organização criminosa,
“devidamente estruturada e de elevada envergadura”.
A droga teria como destino o Porto de Antuérpia, na
Bélgica. Porém, antes que fosse embarcada no navio Cap San Males, que estava
atracado no terminal da Santos Brasil, na margem esquerda do Porto de Santos,
em Guarujá, auditores da Receita Federal do Brasil (RFB) a descobriram
escondida dentro de um contêiner, vistoriado com o auxílio de escâner. Dividida
em tabletes, a cocaína estava no meio de fardos de papel. Na ocasião, ninguém
foi preso, mas a Polícia Federal (PF) apurou como ocorreu a contaminação do
cofre de carga.
Recurso
em liberdade
Possuidor de uma condenação por tráfico de droga
transitada em julgado, o motorista Alexsandro da Silva foi condenado a 11 anos,
quatro meses e três dias de reclusão. A pena aplicada a Cristiano Martins dos
Santos Quintas, analista de pátio do terminal Santos Brasil, que é primário,
foi de nove anos, oito meses e 20 dias. Como ambos responderam à ação penal
soltos, eles poderão apelar em liberdade. Um segundo caminhoneiro foi
denunciado, mas ele teve a punibilidade extinta porque faleceu de Covid-19.
Segundo o Ministério Público Federal (MPF), na
noite de 23 de outubro de 2019, em um intervalo de aproximadamente cinco
minutos, os caminhoneiros chegaram na Santos Brasil dirigindo veículos com um
contêiner cada. Após permanecerem por curto período parados próximo à balança,
ao invés de serem direcionados ao local onde deveriam entregar os cofres de
carga destinados à exportação, os motoristas foram guiados para outra quadra do
terminal, onde se encontrava o contêiner a ser contaminado.
O planejamento de entrega dos cofres de carga é
realizado de forma automática. Porém, o funcionário do terminal efetuou uma
alteração no sistema informatizado para que fosse indicado um novo lugar.
Conforme a denúncia, a cocaína estava na cabine do caminhão dirigido por
Alexsandro, de onde também saíram alguns homens não identificados para
introduzir a droga no contêiner destinado à Bélgica. Enquanto era realizada
essa operação, os motoristas tentaram encobrir campo de visão de câmeras de
segurança.
Sob o pretexto de verificar eventual falha
mecânica, Alexsandro abriu o capô do veículo e a porta do lado do passageiro
para reduzir o alcance das câmeras, enquanto o motorista falecido, com o mesmo
propósito, estacionou na frente do caminhão do colega. Consumada a colocação da
cocaína no contêiner, o operador de pátio usou indevidamente a senha de outro
funcionário do terminal para que um guindaste içasse o cofre de carga para
outro lugar, a fim de dificultar a fiscalização e desviar de si a autoria.
Os denunciados negaram o crime e pleitearam a
absolvição por insuficiência de prova. Porém, caso não fosse esse o
entendimento do juízo, requereram a aplicação da minorante do tráfico
privilegiado. Roberto Lemos rejeitou tais pedidos, reconhecendo que “as
gravações das imagens da ação criminosa perpetrada pelos acusados constituem
prova forte o suficiente para impor, por si só, a atribuição da autoria de forma
inquestionável aos réus”.
O julgador destacou na sentença que o setor de
segurança da Santos Brasil, com base nas imagens das suas câmeras, estabeleceu
a cronologia da movimentação dos caminhoneiros dentro do terminal. Além disso,
a empresa elaborou relatório que “evidencia” que o seu funcionário realizou
alterações no sistema automático para redirecionar os motoristas no pátio e
depois utilizou de forma indevida a senha do colega para realocar o contêiner contaminado
com o entorpecente.
O magistrado concluiu que, “para além do campo do
infortúnio das meras coincidências”, ficou comprovado que os destinos dos dois
caminhões foram alterados manualmente pelo operador de pátio para o exato local
onde se encontrava contêiner no qual foi introduzida a cocaína. Também não
restaram dúvidas de que os motoristas posicionaram os veículos para a
dificultar o monitoramento das câmeras de vigilância. Com 15 anos de empresa, o
funcionário réu foi demitido por justa causa.
Fonte: VadeNews/Por Eduardo Velozo Fuccia
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